domingo, 9 de março de 2008

Devido a natureza etinerante desses povos somos levados a pensar que as representações ou fetiches fossem demasiado raros e incomuns.

Com o desenvolvimento da agricultura o homem ampliou consideravelmente sua autonomia com relação ao meio, pois tornou-se capaz de não apenas produzir seus alimentos, mas até mesmo de conservar algum excedente.

Excedente que possibilitou sua sedentarização.

Ocorre todavia que a sedentarização é uma faca de dois gumes: pois ao mesmo tempo que emancipa o homem nomadismo e capacita-o para produzir uma cultura cada vez mais rica, atrela necessariamente essa cultura e esse homem a uma determinada região, expondo-o em certas ocasiões a um terrivel dilema: manter-se fixo e suportar um certo período de privações ou abandonar todos os bens - digo suas habitações e os túmulos de seus maiores - que não puder transportar consigo, para seguir, como seus antepassados, em demanda doutra região, mais fértil e aprasivel.

Diante desse terrivel impasse, entre o saber como plantar e conservar os alimentos e o de ignorar concomitantemente as leis naturais que presidem os fenômenos e que condicionam a colheita - fadando-a muitas vezes a destuição - o homem encontrou como que uma terceira via na personificação e divinização das forças naturais, nos fetiches, na sofisticação dos rituais, nos milagres, enfim em tudo que se chama religião primitiva...

De sua incerteza e de seu medo brotou um sistema religioso tanto mais complexo. De sua ignorância invencivel brotou a fé nesse mundo paralelo todo povoado de seres divinos...

Em sua ingenuidade imaginou que a chuva seria controlada por um determinado espírito ou deus, que o raio seria brandido por outra entidade similar, o trovão por outra, os raios escaldantes do sol por um outra e em cada fenômeno natural discerniu um agente sobrenatural.

Desta forma as divindades e simulacros foram multiplicados ao infinito e para servir a cada um detes caprichosos senhores foi logo consituido um corpo clerical.

A importância que nossos antepassados ligavam a esses sacerdotes primitivos e aos ritos que oficiavam era por assim dizer tamanha, que parte dos excedentes alimentares lhes era reservada.

Desse modo o primeiro grupo ou casta especializada surgido no corpo social foi o sacerdócio, responsável, segundo criam, pelo bom sucesso das colheitas...

Aliviados de todo trabalho pesado é bastante provavel que esses sacerdotes se dedicassem a observar com máxima atenção tudo quanto fosse concernente a plantação, germinação, colheita, etc; adquirindo com isso as primeiras noções positivas de agronomia, noções que associavam a seus ritos, assegurando de fato o sucesso das colheitas e aumentando ainda mais o seu prestígio.

Surgida nos planaltos centrais da Eurásia a agricultura só foi capaz de engrendrar comunidades tanto mais populosas e complexas, as margens das grandes planícies ou vales aluvionais como o Nilo, a Mesopotâmia e o Indus, regiões que a partir do quinto e quarto milênios a C passaram a ter suas potencialidades exploradas por diversos grupos humanos.

Explorar tais potencialidades significava, grosso modo, irrigar as terras secas que margeavam os rios e regatos dessas regiões, convertendo-as em campos destinados ao plântio de suprimentos.

Como obras tão trabalhosas não podiam ser implementadas pelos individuos isoladamente diversos proprietários tiveram e se associar, misturar, e fundir, para poder criar, todo um sistema, bastante amplo, de canais e comportas.

Certamente que essa associação de trabalhadores favorecia e valorizava o dinamisno daqueles que coordenavam e que passaram a liderar, primeiramente, esses trabalhos e depois toda vida social.

Ao que tudo indica os promotores ou incentivadores dessas obras foram os líderes religiosos e sacerdotes, os quais acabaram assumindo poder temporal na maioria dessas coletividades emergentes.

Essa liderança religiosa ou sacerdotal é evidenciada pelo fato de que os primeiros núcleos urbanos - ao menos na Mesopotâmia e no Egito - concentrava-se em torno dos grandes santuários religiosos.

As pesquisas arqueológicas também tem evidenciado o fato de que nesses santuários ou ao lado deles ficavam localizados os armazens nos quais os excedentes alimentícios eram guardados tendo em vista uma calamidade futura que porventura os ritos não fossem capazes de exconjurar.

Nessas ocasiões os sacerdotes ficavam responsáveis por distribuir rações a toda população o que funcionava como uma espécie de seguro do qual dispunham as grandes cidades.

Foi graças a esse primitivo seguro de vida que a cidade fez tanto sucesso nessas regiões urbanizando-as de modo tão acelerado.

Sabedoras de que nessas coletividades havia uma reserva garantida de alimentos, populações inteiras das regiões limitrofes não tardaram a instalar-se nelas. Com isso a força de trabalho aumentava gradativamente, as obras de irrigação eram intensificadas, a área de plantio aumentava e com ela a produção.

Conforme as populações e grupos tribais iam se instalando na periferia das cidades, levavam consigo suas divindades onerando proporcionalmente o número de deícolas.

A própria divisão e especialização do trabalho, favorecida pelo sedentarismo e pelo acúmulo de excedentes alimentares, não deixou de refletir-se sobre o mundo espiritual de modo que até mesmo os deuses tiveram que especializar suas funções.

Por isso registra o Hiponense no capítulo nono, do sexto livro da "Cidade de Deus." : "Que dizer dos ofícios dos deuses, tão vil e pormenorizadamente repartidos."

"diespiter dava vida ao homem, vaticanus fazia com que soltasse os primeiros vagidos, educa ensinava-o a comer, cumina velava sobre seu berço, statana mantinha-o de pé... vervactor protegia os primeiros trabalhos nos campos, messor as ceifas, convector as colheitas, aesculus guardava as moedas de bronze, argentarius as de prata, iterduca guiava os viajantes, demiduca acompanhavam os homens quando estes regressavam a seus lares, etc." In Mattoso, 1952

Até que - segundo Petrônio - o número de seres divinos acabou suplantando o de seres humanos e a idéia de um Ser absoluto, comum as populações mais primitivas e atrasadas, caindo no mais completo esquecimento.

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